segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Cartas ao vento

São tão pitorescas as mulheres que escrevem o que estão pensando, o que estão sentindo. Digo as mulheres, porque os homens andam tão desanimados em expressar o que pensam, preferindo reter para si.

Noutros tempos, toda menina sensível tinha um diário, que podia até ser um caderninho, todo pintadinho, com flores, desenhinhos, marquinhas de beijos colocadas com o batom cor de rosa de menina moça ou do batom vermelho habilidosamente surrupiado das mães. E, se estavam apaixonadinhas de forma platônica pelo professor de matemática da quinta série, aí tinha coraçõezinhos com flechinhas. Mas ninguém podia ver, mesmo que nele só tivesse registros de coisas sem sentidos para os outros como “hoje, ele me elogiou quando entregou a prova e eu tirei dez”. Nestes pequenos diários, elas guardavam as coisinhas delas, de forma tão corriqueira e ao mesmo tempo únicas. Daí sob uma pequena decepção ou frustração da vida, lá se iam as páginas que julgavam não dever ter escritas para o lixo.

Nos dias de hoje essa peculiaridade mudou de formato, mas continua bombando de forma irreversível e até irreverente, eu diria. Como se multiplicam os blogues. Daí, mesmo após deixarem a adolescência, é hora de algumas mulheres revelarem o quanto sua sensibilidade foi transformada pelas paixões, pelas decepções, pelos amores vividos e pelos não vividos e nele vertem todo o doce fruto da maturidade ou sopram o hálito suave e perfumado das descobertas que ainda anseiam viver. Outras vezes, simplesmente escolhem um tema e sobre ele revelam de si, como moda, atualidades, livros, cinema, estilo. Em todos estes temas sobressaem-se imagens interessantíssimas, fotos esbanjando elegância e sensualidade, textos que refletem o quando as palavras conseguem demonstrar o conteúdo que cada uma possui.

Os blogues masculinos, em bem menor quantidade, em sua maioria são mais pontuais, mais diretos ao que se propõe. Daí a leveza das mulheres também se sobressaírem nesse meio de comunicação. Nos blogues escritos por mulheres sempre há uma revelação mais íntima que torna o leitor mais interessado. Sempre há um vento que elas sopram com as palavras que refrigera o atento leitor de forma reflexiva. Por exemplo, uma mulher apaixonada escreve de forma leve, como se estivesse abanando com as palavras um leque de seda japonesa. Uma mulher decepcionada com a vida escreve de forma agressiva, como se inconscientemente estivesse expondo seu estado de espírito pela dor, não pela ferida. E por nos tornamos eternas crianças diante do amor, da paixão, do desejo, daí a necessidade de escrever o que sentimos.

Talvez os blogues tenham se tornado a melhor forma de suprir a ausência das cartas de amor. Quanto tempo viveríamos sem elas? (as cartas de amor). Muitas pessoas julgam ridículo alguém passar seu tempo escrevendo em um blogue, talvez falte sensibilidade aos tais, também julgavam ridículas as cartas de amor. Fernando Pessoa, usando o heterônimo (nick name) Álvaro de Campos escreveu “Todas as cartas de amor são/ Ridículas. / Não seriam cartas de amor se não fossem / Ridículas. … / Mas, afinal, / Só as criaturas que nunca escreveram / Cartas de amor / É que são / Ridículas”.

É preciso sensibilidade para se escrever sobre pessoalidades em um blogue, reconheço. Mas não é requisito esbanjar as regras gramaticais do idioma de Camões. Eu mesmo neste blogue, vivo pisando distraidamente na flor do lácio. Tenho uma dificuldade enorme em ser sucinto. Mas reconheço que acima de tudo é preciso simplicidade.

E por falar em cartas de amor, agora digitais, há sempre uma empolgação quando a mensagem é transmitida, recebida e entendia. É como naquele trecho escrito por Monteiro Lobato no livro Reinações de Narizinho, onde ela responde a um pedido de casamento feito por carta pelo Príncipe Escamado do reino das Águas Claras, com outra carta com um simples 'sim!'. Onde ele conclui que ela não se limitou a aceitar a proposta, mas a aceitou com entusiasmo, por causa do ponto de exclamação, conclui ele. Na sequência, outras cartas foram trocadas por eles, o que acho mais bonito nessa estória é que Narizinho respondia as cartas com presentes, ora uma flor, ora um grilinho do gramado, ora uma rosada e roliça minhoca. Até uma rosquinha que ela frisou que fora enrolada pelas suas próprias mãos, tendo o príncipe transformado a rosquinha numa coroa.

Escrever num blogue tem um pouco disso, uma troca de presentes. Nem sempre gostamos dos presentes que nos são oferecidos, mas quando gostamos nos sentimos mais próximos de quem nos presenteia, posto que somos tocados. Ainda quando escrevemos sem destinatário, o vento da sensibilidade sopra as plumas do texto e pousa suavemente numa pessoa aqui, faz cócegas noutro mais atento ali, passa despercebido em um distraído acolá e repousa na mente de quem escreveu.

Moa Will 

Um comentário:

  1. Olá,

    Confesso que senti-me docemente lisonjeado, pois acho seu cantinho tão delicado e de bom gosto.

    E nas minhas próprias palavras: Escrever num blogue tem um pouco disso, uma troca de presentes. Nem sempre gostamos dos presentes que nos são oferecidos, mas quando gostamos nos sentimos mais próximos de quem nos presenteia, posto que somos tocados.

    Respeitoso bjim.

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